A importância do governo eletrónico
Verificou-se, na última grande vaga de imigrantes que chegaram a Portugal, uma carga excessiva sobre as estruturas do Estado e dificultou-se cada vez mais o registo temporário. Consequentemente, fomos assistindo a uma integração cada vez mais deficiente, com um crescimento de episódios de ódio e a criação de guetos de exclusão social nas grandes áreas metropolitanas e em algumas zonas do país, deixando-se muitas pessoas à mercê das máfias que traficam e escravizam seres humanos.
É necessário ultrapassar algumas posturas reativas, defensivas e burocráticas nas políticas públicas, em algumas das estruturas e na gestão da informação, de que podem resultar consequências graves para os sistemas dos serviços públicos, para a economia e para a sociedade portuguesa em geral.
Infelizmente, Portugal ainda está longe de acolher, identificar e controlar com eficácia os imigrantes, continuando a ter uma imagem internacional de um país de “portas abertas”, o que acaba por estimular narrativas populistas e xenófobas, que alimentam a perceção de medo e apelo a soluções securitárias.
Antes de chegarem à Agência para a Integração de Migração e Asilo (AIMA), e depois de entrarem no nosso país, oficialmente através dos consulados ou pelas rotas migratórias clandestinas, muitos imigrantes ainda vagueiam à mercê de máfias e vão casualmente entrando no sistema institucional português à medida que precisam de resolver os seus eventos de vida, nomeadamente através da obtenção de um número fiscal, para poderem abrir uma conta bancária, através dos atendimentos de emergência no SNS, quando adoecem ou têm um acidente ou mediante a inscrição na Segurança Social, quando acabam por encontrar um trabalho legal e entrar na economia formal, muitas vezes ainda sem autorização de residência.
Durante muito tempo, muitos imigrantes permanecem num limbo de semi-clandestinidade, apenas na esfera das máfias e da segurança pública.

É por isso que a Associação para a Promoção e Desenvolvimento da Sociedade da Informação (APDSI) defende, nas suas recentes tomadas de posição, a atribuição urgente e prioritária de um Cartão do Cidadão Imigrante, que traga o mais cedo possível estas pessoas para a esfera da identificação do Estado português, retirando-as da esfera mafiosa e securitária, à medida que aguardam uma autorização de residência por parte da AIMA, que passa por um controle bastante burocrático e moroso dos documentos do país de origem.
Em nosso entender, o controle e o rastreamento da permanência em território português dos cidadãos imigrantes passaria a ser automático e bastante fluido, através das sucessivas interações no âmbito da resolução dos seus eventos de vida e da consulta em tempo real com recurso à APP id-GOV, por parte das autoridades, à semelhança do que pode acontecer com qualquer cidadão português, de forma dinâmica e sem riscos de falsificação de documentos.
É por isso que estamos a propor uma nova arquitetura processual para o controle e integração dos imigrantes, em que se pretende transformar a AIMA numa entidade exclusivamente dedicada à sua vocação de acolhimento e integração de imigrantes e asilados, libertando-a dos processos burocráticos que podem e devem ser assegurados pelos diversos organismos do Estado e ONGs, prestadores de serviços públicos a nível nacional e autárquico, descartando ao mesmo tempo todas as funções de controle securitário, que devem estar a cargo das forças policiais e de investigação criminal.
Através do uso adequado de tecnologias digitais, é possível integrar os imigrantes e, em especial, protegê-los de redes que traficam e escravizam seres humanos, passando a colocar o Estado no centro das políticas públicas de imigração universais e inclusivas, com um propósito comum, integrado e sistémico, em colaboração com a academia e com as organizações não governamentais, assegurando o envolvimento consciente e informado da sociedade civil em geral.
O desenvolvimento acelerado das tecnologias da informação torna mais fácil a gestão integrada e sustentável da totalidade do território. Por isso, impõe-se uma preocupação constante em apoiar todo o potencial humano existente, de forma a tornar mais fluida a resolução dos eventos de vida de todos os cidadãos nacionais e estrangeiros, continuando a garantir a boa perceção de segurança de quem visita ou vive no nosso país, bem como a viabilizar algumas das atividades económicas de maior relevo, como é o caso do turismo.
Opinião de Luís Vidigal – Representante da sociedade civil na Rede Nacional de Administração Aberta, consultor internacional de e-Government, ativista cívico e ex-dirigente de topo em áreas tecnológicas e de modernização administrativa