Uma nova versão do Programa de Sustentabilidade dos Vinhos do Alentejo (PSVA) foi apresentada no dia 7 deste mês. Este é um projeto da Comissão Vitivinícola Regional Alentejana (CVRA), lançado em 2015, que, desde a sua génese, conta com a participação ativa da Universidade de Évora (UÉ).
Segundo os promotores, o objetivo é que “os produtores aderentes ao PSVA, que representam já 58 por cento da área total de vinha do Alentejo, possam, através da utilização mais responsável dos recursos necessários à cultura das vinhas, tornar a produção mais resiliente e adaptada às condições naturais”.

É ainda salientado que “esta é uma iniciativa pioneira em Portugal que, há três anos, lançou o primeiro e único certificado de produção sustentável do país”.
Esta nova versão, o PSVA2.0, conta também com a parceria da Associação Natureza Portugal (ANP), representante da WWF (World Wide Fund For Nature), reforçando assim o papel de destaque que esta região vitivinícola tem no domínio das práticas sustentáveis.
A sua apresentação decorreu num evento realizado na Herdade das Servas (concelho de Estremoz), com a presença de representantes das entidades envolvidas, bem como de diversos produtores.
De acordo com a CVRA, este programa de sustentabilidade “integra já 639 membros, sendo um fator de diferenciação dos Vinhos do Alentejo, tanto para o mercado interno, uma vez que a região é pioneira no caminho para a sustentabilidade, como ao nível internacional, onde as práticas sustentáveis são cada vez mais valorizadas”.
Relativamente ao certificado de produção sustentável do país, a mesma fonte realçou que, “volvidos três anos após o lançamento do primeiro selo, já se contam 20 produtores a ostentar a certificação, dando assim aos consumidores a garantia de que aqueles vinhos cumprem com boas práticas de poupança de recursos, promovem a biodiversidade, utilizam energias renováveis, protegem solos ou fomentam iniciativas que envolvem toda a comunidade na adoção de comportamentos sustentáveis”.
Quanto à revisão do PSVA, os promotores explicaram que “foi feita sob um olhar atento para vertentes como a biodiversidade, pesticidas, clima e água e a nova versão passa agora a incluir dois novos capítulos (‘Resiliência e adaptação às alterações climáticas’ e ‘Economia Circular’), perfazendo um total de 20”.
É ainda referido que, “apesar de mantidos os 171 critérios de avaliação, 74 por cento foram melhorados e foram incluídos 29 novos itens, dando-se destaque a variáveis como o uso de castas mais resilientes e de diversidade genética; a eficiência dos fatores de produção; a promoção do consumo responsável de vinhos junto dos consumidores; a equidade salarial entre géneros; ou, ainda, o contributo para a inserção social de pessoas com deficiência”.

“Um terço do vinho do Alentejo já é de produção sustentável”
Em declarações ao Diário do Sul, João Barroso, coordenador do PSVA, adiantou que “achámos que devíamos fazer uma revisão dos conteúdos do programa, sobretudo, por uma questão de maior inclusão do setor”, especificando que “houve uma atualização de conceitos e conteúdos porque passaram quase dez anos e muita coisa mudou na área da sustentabilidade durante este período”.

Evidenciou que “é um manual muito detalhado e, para tentar agilizar o trabalho dos agentes económicos, achámos que era importante otimizar alguns conceitos, de forma a facilitar a interpretação do que é pedido aos produtores”.
A par disso, João Barroso realçou que, “para além de já termos um parceiro fulcral, a UÉ, um parceiro científico, temos agora também a parceria de uma ONG de defesa do ambiente, a ANP/WWF”.
Reiterou que, “regra geral, são partes interessadas que costumam estar ‘de costas voltadas’ e aqui fizemos o contrário, fomos desafiá-los a ajudarem-nos a levantar ainda mais a fasquia do trabalho que temos feito e o resultado é extraordinário”.
Quanto ao número de adesões, o mesmo responsável disse que “temos 639 membros (em cerca de 1800 operadores), sendo que 20 já estão certificados, que representam perto de 25 por cento da área do Alentejo”.
Revelou ainda que “isto representa aproximadamente 33 por cento do volume de vinho, o que significa que um terço do vinho do Alentejo já é de produção sustentável”.
Nesse âmbito, João Barroso arriscou dizer que “estes números fazem com que o Alentejo seja provavelmente a região vitivinícola europeia mais sustentável que temos neste momento, o que nos deixa com muito orgulho, mas também muita responsabilidade”.
Por sua vez, o principal aspeto destacado pelo presidente da CVRA, Francisco Mateus, foi o facto de “estarmos há dez anos, gradualmente, a transformar a forma como o vinho é produzido no Alentejo, olhando desde as vinhas até às garrafas”.

Na sua opinião, “hoje em dia, há muito mais atenção por parte dos produtores alentejanos à forma como trabalham a terra, as castas que escolhem, a forma como as vinhas são tratadas, o percurso das uvas até à adega, aquilo que se passa dentro da adega em termos de energia, de água, de resíduos ou de relação com os trabalhadores”, considerando que “é um paradigma que está a mudar aqui no Alentejo para que nós consigamos ter cá este setor com esta vitalidade daqui a 20 anos”.
Francisco Mateus sustentou que, “sabemos que estamos num contexto climático e económico que é adverso, sabemos que a agricultura é cada vez mais difícil, mas com o PSVA estamos de facto a conseguir que os produtores se adaptem a uma nova realidade e estejam prontos para enfrentar mais 50 anos de produção de vinho aqui na região”.
Os parceiros e os produtores também destacaram a importância que um programa como este assume.

Maria Raquel Lucas (professora da Universidade de Évora): “A UÉ está envolvida no PSVA desde a sua génese, na perspetiva de contribuir para criar o referencial de sustentabilidade, ou seja, este instrumento de gestão com todos os critérios e as áreas temáticas de intervenção, isto porque a UÉ tem investigação, é um centro de criação e transmissão de saber. Este foi um dos principais momentos onde essa transmissão do saber foi mais real, onde esse saber foi mais transformado em conhecimento aplicado concretamente à questão do solo, da gestão dos resíduos, da eficiência energética ou da gestão dos recursos humanos, por exemplo. Ou seja, todas as áreas de intervenção do programa onde era possível, de uma forma suportada científica e tecnicamente, justificarem algumas das opções que foram tomadas para a melhoria dos sistemas de produção e de todos os processos”.

Ângela Morgado (diretora executiva da ANP/WWF Portugal): “Para nós, esta colaboração tem uma importância extrema porque de uma perspetiva mais genérica mostra que ambiente e agricultura podem caminhar lado a lado e não o contrário, ou seja, é uma mudança de paradigma. Depois também se enquadra numa área preferencial para nós, que é a alimentação. Ao aceitarmos este desafio viemos demonstrar que é possível uma transição alimentar e que os produtos que vêm da agricultura devem respeitar os limites do nosso planeta. Para além da CVRA já ter um programa muito importante do ponto de vista de sustentabilidade, nós considerámos que poderíamos ir mais longe e analisámos várias perspetivas, nomeadamente adaptação e resiliência às alterações climáticas, medidas para promover ainda mais a defesa da biodiversidade ou a gestão dos recursos hídricos. Mas sobretudo trouxemos essa diferenciação de provar que pode haver produtos agrícolas e sistema alimentar mais justo”.

Renato Neves (diretor de produção da Herdade das Servas): “A Herdade das Servas está integrada no PSVA desde o início do programa e estamos certificados desde agosto deste ano, pelo que, até ao momento, somos o último produtor a ser certificado. A visão de sustentabilidade sempre foi vincada na Herdade das Servas e o programa tem-nos ajudado nessa validação, no reconhecimento das nossas práticas e também na melhoria contínua, já que o programa é dinâmico e exigente. Não é fácil manter todos os ‘capítulos’ em dia, temos sempre esta necessidade de irmos melhorando e fazendo cada vez melhor, esse é o proveito que nós tiramos do programa”.

Pedro Baptista (enólogo da Adega Cartuxa): “A Adega Cartuxa está envolvida com o PSVA desde a sua criação. No que diz respeito à certificação, estamos neste momento a iniciar o processo que decorrerá com a auditoria, com vista à sua obtenção. O facto de acontecer agora tem a ver com questões de organização interna, chegou efetivamente o momento de avançar para a certificação daquilo em que estamos a trabalhar e que faz parte do nosso dia-a-dia há bastantes anos. Na verdade, tudo decorre muito naturalmente, trata-se, sobretudo, de sistematizar e também de ter registos que comprovem aquilo que fazemos há longa data. É uma passagem absolutamente natural, trata-se, sobretudo, de organização de processos e de registos que nos permitam demonstrar aquilo que já fazemos. A par disso, este é um processo de melhoria contínua, onde sempre encontramos oportunidades para fazer ainda melhor”.
Texto: Redação DS / Marina Pardal
Fotos: DS