O Governo constituiu o Empreendimento de Aproveitamento Hidráulico de Fins Múltiplos do Crato (EAHFMC), vulgo Barragem do Pisão, e adotou medidas excecionais para a concretização do mesmo, com a classificação como empreendimento de interesse público nacional, através do Decreto-Lei nº 62/2022, publicado ontem e que entra hoje em vigor.
Governo constitui e aprova empreendimento em termos ambientais de um dia para outro
Curiosamente, este empreendimento foi aprovado no Conselho de Ministros de 1 de setembro de 2022, apesar de já ter sido sujeito a um processo de Avaliação de Impacte Ambiental, previamente à sua constituição, o qual esteve em consulta pública até 11 de agosto. Em apenas 15 dias úteis, o governo emitiu a Declaração de Impacte Ambiental favorável condicionada a 2 de setembro, revelando que a decisão sobre o empreendimento já estava tomada.
O processo de consulta pública foi bastante participado, contando com contributos não de entidades públicas mas também de várias Organizações Não Governamentais do Ambiente e existiram de 147 cidadãos, tendo todos discordado do projeto, o que reflete a forma como é descurado o procedimento de Avaliação de Impacte Ambiental.
O governo veio declarar também a imprescindível utilidade pública, referindo que fica autorizado o corte ou arranque de sobreiros e azinheiras, em povoamentos ou isolados, limitado ao número de exemplares identificados por despacho do membro do Governo responsável pela área do ambiente, o que contraria a legislação aplicável. O estudo não avaliou alternativas de localização do empreendimento e estima-se que o montado, com 37.960 azinheiras e 1.843 sobreiros em povoamento, seja destruído pelo projeto.
A Quercus contesta as medidas excecionais e interesse público para um projeto de regadio, que apenas usou o argumento do abastecimento público para que a Comissão Europeia viabilizasse o financiamento do Programa de Recuperação e Resiliência.
Para o abastecimento público dever-se-á aproveitar dignamente as albufeiras da Póvoa e da Apartadura que estão construídas, modernizando-as e reforçando-as, em lugar de nos darmos ‘ao luxo’ de construir uma nova barragem no Pisão, com uma despesa pública de 171 milhões de euros.
Dever-se-á construir a interligação da Barragem da Apartadura com a Barragem da Póvoa, cuja rede de adutoras praticamente se toca entre os concelhos de Castelo de Vide e Nisa. Esta interligação terá uma distância e um custo mínimos, comparados com a interligação da prevista barragem do Pisão no concelho do Crato até à ETA (Estação de Tratamento de Água para abastecimento público) que se localiza precisamente na Barragem da Póvoa no concelho de Castelo de Vide.
Inundar 724 hectares, destruir os ecossistemas existentes, cortar 40 mil azinheiras e sobreiros num montado produtivo e singular e deslocar o aglomerado urbano do Pisão na sua totalidade, movendo pessoas e bens sem se saber ainda para onde e como, dá que pensar sobre as opções e decisões tomadas à revelia de todos os pareceres das Organizações Não Governamentais de Ambiente.
Fonte: Nota de Imprensa / Quercus